Oi, gente!
Esta semana o tema é Síndrome de Down. O programa estava emocionante. Obrigada a todos que participaram das gravações e parabéns pelos exemplos de amor, iniciativa e superação. É um privilégio poder contar com pessoas como vocês que, mesmo em momentos de dificuldade, encontram forças para ajudar a melhorar a vida de outras pessoas na mesma situação, seja organizando associações, ONGs ou até mesmo vindo até a mídia falar sobre sua história. A experiência de todos é muito importante e o trabalho que vocês desenvolvem também. É por isso que o Papo de Mãe faz questão de divulgá-los e apoiá-los!
Fiquem agora com a entrevista de Rosângela Santos com o Dr. Zan Mustacchi, pediatra, que atende pacientes com síndrome de down há mais de 30 anos em seu consultório e noHospital Público Infantil Darcy Vargas, em São Paulo.
RS: O que é a síndrome de down?
ZM: A síndrome de down é um comprometimento genético, definido por excesso de material cromossômico, especificamente do cromossomo de número 21. Clinicamente, o que a caracteriza definitivamente são 3 aspectos: fenótipo (a imagem dele que parece oriental), a hipotonia com comprometimentos ligamentares (ligamentos frouxos, como se as articulações tivessem mais elasticidade) e, por último, o comprometimento intelectual (aquilo que é definido, hoje, pela OMS como deficiência intelectual). Então, esse tripé: fenótipo, hipotonia e comprometimento intelectual é que caracteriza o indivíduo como portador da síndrome de down.
RS: Este tripé pode ser mais acentuado em algumas pessoas e menos em outras?
ZM: Com certeza. Isto a gente chama de “especificidade clínica variada”. Nós podemos ter mais ou menos comprometimento em cada um dos aspectos. Como não são interligados, se um aspecto é muito comprometido, isto não quer dizer que o outro também será.
RS: De uma maneira geral, como vivem as pessoas que tem a SD hoje no país?
ZM: Nós temos 2 grandes modelos: o primeiro é a faixa etária e o segundo é o sexo. Os homens com SD - como todos nós homens - são mais infantilizados. Então, um garoto de 12, 13 anos ainda é um garotinho. Já a menina, nesta idade, é uma mocinha. Este contexto é mais claro na SD porque os pais tentam mantê-los como uma grande criança permanentemente. Isto é uma grande problemática que nós temos que sanar. Quando é homem então, é mais tratado como criança ainda: “essa é minha criança de 30 anos”. Isso não existe! Por outro lado, com as mulheres, por terem uma capacidade diferente - em geral falam melhor que os homens - não acontece o mesmo. Além disto, o indivíduo com síndrome de down é bem caracterizado dentro do contexto comportamental. Ele é mais inibido, mais protegido, mais cuidado pela sociedade. Curiosamente, as mulheres se viram melhor do que homens, ficam menos doentes...
RS: Ainda existe muito preconceito?
ZM: Óbvio. Não tem nem dúvida. E ele existe por uma desinformação, uma falta de educação, basicamente. A desinformação é uma condição de educação básica, primária.
RS: Tem muita gente que olha a pessoa com down e sente pena? Isso é frequente?
ZM: Sim. Sente pena do individuo e da família. E isto prejudica o processo de socialização. No momento em que tenho restrições para com alguém, eu deixo de dar oportunidades para ele. Os portadores têm que ser vistos como comuns, mesmo não sendo, mesmo não tendo todas as capacidades. Mas quem vai definir os limites são eles mesmos. Nós temos condições de oferecer a eles tudo. Quem vai restringir são eles mesmos. O grande segredo é fazer justamente isso: dar oportunidade para todos os indivíduos. Só assim eles vão conseguir se diferenciar.
RS: A criança com SD tem que frequentar escola de crianças comuns ou especiais?
ZM: Se o indivíduo conviver com modelos apropriados, a tendência é que ele aprenda coisas melhores. Então, ela precisa se enturmar com pessoas que possam ensiná-la e que haja um equilíbrio nisto: “eu ensino e ele me ensina”. Traduzindo, é essencial a escolaridade regular para qualquer pessoa, tenha ou não comprometimentos.
RS: Esses comprometimentos genéticos decorrentes da SD podem ser corrigidos? Existe tratamento clínico, cirúrgico... até onde vai medicina?
ZM: Vamos considerar uma coisa importante: hoje, a estrutura cromossômica que é a genética, ainda não é mutante dentro da lapidação técnica. Entretanto, efeitos causados por esta alteração cromossômica (quase 99%) são maleáveis e mutáveis. O mais freqüente deles são, por exemplo, é cardiopatia congênita. 50% da população com SD nasce com problema cardíaco e este grupo tem indicação cirúrgica. Mas são operados e são curados. Outro exemplo: eles têm mais chance de ter leucemia, mas quando a doença é diagnosticada prematuramente, a cura é próxima de 100% (enquanto um não down cura em 80% das vezes). Portanto, o down consegue até melhorar a reversão do processo defeituoso as custas da alteração cromossômica. Então, basta oferecer condição de diagnóstico e tratamento oportuno. É por isso que, hoje, existe um envolvimento clínico muito grande, e o Brasil é o segundo país do mundo nisso. Só perdemos para a Espanha. Temos um diferencial muito grande em oferecer atendimento de qualidade para população com SD.
RS: Como é para os pais quando recebem a notícia?
ZM: Ninguém espera um indivíduo com qualquer modelo de comprometimento. A primeira pergunta que é feita pelo casal quando o bebê nasce é se é perfeito. Mas se tem diagnóstico de SD você já pré-conceitua que ele terá comprometimentos intelectuais. O que passa na cabeça dos pais é “o que será dele quando eu não estiver presente?”
RS: O down pode ter vida normal, e a família?
ZM. Sim. Deve ser desta forma. Difícil é atingirmos uma racionalidade social familiar para que isso ocorra. Mas este é hoje o grande objetivo. Eu acho que é um trabalho como um todo: sociedade, família e indivíduo. Existe rejeição? Claro, eu não quero ter filho com problema, quem quer? Num primeiro momento, existe rejeição, isso é natural. Isso não é algo que seja penoso, nem condenável. É natural.
RS: Quais são as características da pessoa com SD?
ZM: Depende da forma pela qual foi tratado. A maior peculiaridade dele é lhe devolver em triplo o que lhe é oferecido. Se você olhar com carinho, ele te beija, te abraça. Se você olhar feio, ele te chuta. Ou gosta, ou não gosta. Ou é amoroso, ou agressivo. Depende de como ele é tratado.
RS: E o mercado de trabalho?
ZM: Eles já estão começando a entrar no mercado de trabalho em alguns lugares. Ainda é pouco, perto do que a gente gostaria, mas vão chegar lá. Além disto, eles namoram, casam, têm filhos...
RS: Como é para o senhor que acompanha estes pacientes há mais de 30 anos?
ZM: O que mais me emociona é perceber que uma mãe, de fato, acredita que ela pode oferecer alguma coisa para o filho dela. Elas vêem que o fazer é dar oportunidade. E dar oportunidade de ver este indivíduo crescer é a coisa mais emocionante que tem. Este indivíduo nasceu de uma situação onde a mãe desacreditava de tudo. E, de repente, ela vê florescer uma vida que ela não acreditava. Então, a mãe, quando tem um bebê com down, tem preconceitos – muitas vezes por coisas até ditas por profissionais, infelizmente ainda não bem habilitados – aí, de repente, ela diz “Zan, ele está sentando, está andando... falou papai, falou mamãe...” Olha, fico arrepiado... Isso é fabuloso! A mãe perceber que seu filho é um indivíduo como os outros, perceber que é uma criança, que é um ser humano... Dê oportunidade e verás o resultado!
RS: E a expectativa de vida aumentou muito?
ZM: Sim. Hoje, meu paciente mais velho tem 74 anos de idade. E o mais velho que tive faleceu com 79 anos! Fui pediatra dele - mas não durante 79 anos... rsrsrsrs
Para saber mais:
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